segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

África-Madina Mandinga-Guiné


 por José Graça Gaipo 
A Véspera de Natal
24 de Dezembro de 1973

Em Madina Mandinga, o raiar da aurora, despontou em crepúsculo, pincelado de tons solares quentes, como que a esconder o fim do ciclo do Advento.
A manhã, parecia uma autêntica festa boreal anunciando o grande luzeiro de há muito proclamado pelo  profeta Isaías.
A manhã do dia 24, parecia alongar-se no tempo e, ansiosos, em azáfama desenfreada de rostos sorridentes, pronunciavam de suas bocas, conversas carregadas de sentimentos e lembranças natalícias.
No espírito de cada um, transparecia alguma preocupação, a data de 24, a qual, se pretendia festejar  e celebrar sem qualquer tropelia bélica em tempo e local inesperado.
Entre a malta, os avisos eram visíveis de  preocupação, porque a vigilância, além de importantíssima, merecia  atenção redobrada, cuidado e zelo, considerando-se os possíveis excessos de cada um, na forma como festejaria  o Natal.

A tarde, esta começava  com uma acção humana de movimentos e serviços de naturezas diferentes, mas comuns, enquanto outros, eram encarregues da organização dos  haveres comestíveis em preparação, pelo que outros ainda, ajustavam as mesas, ditadas à decoração com as diversas iguarias da época, já preparadas e recebidas, dos mais diferentes lugares.
Os estados de espírito humano, eram notórios e, revelavam maior afectividade e companheirismo comunitário, em que pronunciavam as cordiais e milenárias palavras de - Boas Festas e Feliz Natal.

O pôr-do-sol, na zona de Madina Mandinga, aproximou-se  e esvaíu-se no horizonte para dar lugar ao luz que fusco de mais uma noite, caracterizada de  especial relevância, que a distância do tempo /e fuso horário, anunciaria bem cedo, a vigília do natal.
Na parada do aquartelamento, era bem visível o aparato desigual de movimentos, de partilha invulgar, não havendo sinais de prendas  nem  embrulhos coloridos de mão em mão, como é usual e costume na nossa tradição portuguesa naquela noite, mas apenas, a preparação de  uma organizada e especial ceia de natal em hora antecipada, bem recheada de iguarias alimentares de, cabrito assado, galinha, gazela, e outros animais de criação doméstica, e campestre, adquirida de forma amiga e conjunta.

Entre o final da tarde e o anoitecer, lá se iniciou o festado jantar especial, para que a passagem  da escura noite de 24 para 25, fosse  brindada na alegre saudação  ao Deus Infante nascido.

A “messe de oficiais e sargentos”,  de Madina Mandinga, também não saíra da tonalidade festiva, tendo as mesas decoradas  e apetrechadas de iguarias ligadas à tradicional celebração  natalícia.
Dada a diferença horária, de acordo com o rigor e enquadramento do fuso horário da Guiné, eram indispensáveis os mais cautelosos cuidados de redobrada atenção, pois o tempo festivo  que atravessávamos, era propício à ocasião bélica.
Com alguma emoção e tranquilidade, o Capitão Miliciano José Luís Borges Rodrigues, e na forma improvisada, de mensagem e significado, teceu algumas palavras que tornaram aquele momento muito festivo.
O tom  solene e especial da sua mensagem, de certo que, a todos tocou bem fundo o coração do homem, que só a vergonha e respeito humano, deixou todos de cabisbaixos por alguns momentos, para que as lágrimas do desejo e saudade, não turvassem os olhares  brilhantes e humedecidos das lágrimas que escorreram em gota suave e tranquila  face do rosto, de cada um.
Após aquele momento introdutório, os olhares cruzados, com sorrisos nos lábios e de frontes erguidas, de copos na mão, foi servido o Gin tónico, com gelo e água perrier, brindando-se de forma particular aos mais variados desejos, interiormente invocados.
Fez-se uma pausa para a degustação dos aperitivos, seguindo-se a tão desejada ceia de natal, a qual, foi participada com a maior alegria no comes e bebes, mas também partilhada  e confraternizada com a necessária serenidade e responsabilidade de quantos a celebravam.
Chegadas as zero horas, dentro da simplicidade  sem devaneios e excessos, brindou-se por algum tempo a  Grande e Bela Noite de Natal, em Madina Madinga.
Após este momento precioso e desigual, deu-se continuidade à rotina da noite reforçando os lugares estratégicos com o descanso de algumas horas de sono, até que raiasse a aurora do novo dia.
Foi assim o primeiro Natal em Madina Mandinga, celebrado na data de 24/25 de  Dezembro de 1973 (já lá vão 39 anos).

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