por José Graça Gaipo
A notícia foi curta
e breve, mas escurecida de alguma dor quando, os amigos partem deixando a
saudade das muitas coisas que a vida humana teceu ao longo de um tempo, que,
não pára a sua rotação.
Falar dos amigos
enquanto vivos, é sempre bom. É testemunhar actos humanos, é descortinar e
recordar nos tempos (o presente e o passado), aquilo que a sua capacidade intelectual,
foi capaz de criar no bom sentido, de forma a tornar os actos atraentes e sem
qualquer condicionalismo.
Falar de Fernando
Brito, mais conhecido por “Tio Brito, tracto familiar”, como de filhos se
tratassem naquela conjuntura de tempo e ambiente de guerra, transporta-nos a
todos, reconhecer a figura destacável que ele foi, como Homem, Pai de família, como cidadão
na linha ética e intelectual, e também como profissional na conduta do cumprimento dos deveres e direitos, ao
longo da sua carreira militar.
Como Homem e Pai, foi sempre digno de merecedor
respeito, embora a sua condição profissional por onde enveredara, e na
distância africana, mantinha sempre presente na sua mente, a família e os
filhos. Falava deles, com brilho não só nos olhos, mas também nos lábios e na
forma como os ditava ou soletrava seus nomes, com um sorriso aberto de
bendizer, criando neles um estado de viver alegre.
Como amigo, soube
sempre conjugar e distinguir a linha humana da profissional, mantendo uma
conduta de diálogo, um sabedor ouvinte de olhos fitos naqueles que escutava,
como que a ler o interior do outro, um conselheiro experiente, onde se podia
depositar confiança, acolhedor de amizades, onde a sua visão, respondia sempre
numa linguagem amiga e carinhosa numa perspectiva de longo prazo, revelando
sempre uma atitude e predisposição de pai, que escuta e acolhe o filho para o
aconselhar e dar um rumo que lhe garantisse uma possível sobrevivência humana e
realização pessoal.
Como
cidadão ético, primava pela assertividade das
coisas e dos factos, procurando a simplicidade sem dificultar fosse o que
fosse. Tinha um coração sempre aberto e disposto a uma coragem de enfrentar por
vezes artimanhas de gestos e atitudes de jogos menos positivos. Era muito
prudente, com uma visão que por vezes não lhe era tolerável competir com o que
sonhara. Era cuidadoso em tudo que projectava, e com facilidade lia bem nos
contornos, linguagens e interpretava raciocínios, gestos e atitudes menos
correctas.
Era perspicaz e
persistente nas suas ideias e decisões, procurando sempre dentro dos possíveis
e razoáveis limites conseguir objectivos planificados e em ordem ao bem comum
da comunidade militar de Madina Mandinga.
Como
profissional, era um homem competente, procurando
saber sempre relacionar a atitude e forma profissional no campo da acção, para
que, o ser e estar na vida, não deixasse dúvidas quanto ao cumprimento dos
deveres e obrigações militares, como profissional do quadro.
Como
amigo, de todos e em particular, cada um e cada qual,
poderá ajuizar o que as consciências ditarem, mas tenho a certeza e não
dúvidas, de que foi na maioria das vezes, um amigo com nome de Pai. Era um amigo digno de ser ouvido e
respeitado, independentemente do seu grau na função militar e de profissional.
Recordá-lo
quotidianamente, não é um favor, é um sentimento carinhoso que todos, o
devemos, porque ele foi o caminheiro indicador de muitas situações, apelando
sempre ao bem-estar das nossas vidas, que nada nos faltasse em tempos de tanta
hostilidade bélica.
Ele, era uma rocha
firme em quem se confiava de mão aberta e em quem podíamos falar, desabafar
coisas e lousas desde o particular ao geral de nossas vidas e atitudes.
Estamos em tempo
próprio de pensar um pouco mais nele, Tio
Brito, que, recentemente nos deixou
e, decerto que, seu espírito descansa na ala da Paz, onde os mortos, são os
vivos da Nova Páscoa, da Ressurreição em Cristo.
É tempo de dizermos
e de anunciarmos, a quem quer que seja, que vamos por todos os caminhos, onde
não há rotundas nem cruzamentos, mas sim direccionados num sentido, o da grande
amizade, e que ela “amizade” habite sempre em nós, independentemente do tempo
e do lugar, do sofrimento ou tristeza em que nos encontremos, mas que a firmeza
da alegria nos faça viver caminhando.
Ao grande
caminheiro que esteve connosco, lado a lado em terra africana, Guiné,
apetece-me dedicar-lhe este belo poema, escrito na década de 1968-1970, sem
qualquer previsão do 25 de Abril.
Vão por todos os caminhos
1-Vão por todos os caminhos
os irmãos
injustiçados
que
transformaram a vida
na beleza duma
flor
com a mensagem
do Senhor, Aleluia!
Também vão os
torturados
os mendigos e os
poetas
as crianças
desgarradas
e os suspensos
pela dor,
com a mensagem
do Senhor, Aleluia!
Coro
E clamam
os Homens
este
canto de louvor;
Coro de
caridade,
Evangelho do Amor- Aleluia! Aleluia! Aleluia!
2-Vão por todos os
caminhos
os irmãos da
nossa porta
que nos trazem um sorriso
feito de Paz e
Amor,
É a mensagem do
Senhor, Aleluia!
Os soldados, que
despidos
das armas e das
fardas,
trazem flores trazem pão
- um fruto do seu suor,
É a mensagem do
Senhor, Aleluia.
(Texto de A.
Oliveira)
Nota:
Este poema, pertenceu e pertence à Missa da Esperança, que foi cantada
clandestinamente à porta fechada, na Igreja da Calhete, Ilha de S. Jorge, para
que a PIDE, não nos surpreendesse,
pois estávamos em missão de acampamento e diversão cultural sócio religiosa, em
Agosto.